terça-feira, 14 de setembro de 2010

Sobre o Ego

pipocado por Diego Augusto às 12:00:00 AM

terça-feira, 14

Agora me sou todo ideia, garanto. Quando se desbrava o caminho da Sabedoria, ergue-se-lhe a mão do sofrimento, e é impossível seguir adiante sem antes segurá-la. E não há volta.

Eu já fui como você, eu já tive os mais inocentes sonhos entrincheirados em minha pele. Quando jovem, meus olhos fitavam logo à frente um lindo futuro para as pessoas, olhos estes que hoje nada veem adiante ou acima, afinal tudo está abaixo de mim.

Segurei o mundo em minhas costas por muito tempo, recebendo em troca alguns sorrisos. Mais forte, porém, eu sentia a mão do sofrimento à medida em que eu contemplava mais intensa a Sabedoria, e então dos antigos sorrisos formavam-se olhares de inconformismo e hostilidade. Não conseguiam entender-me, por isso eu os deixei partir.

Esteja certo de que eu tenho poder para erguer de volta o mundo, mas não quero. Concedo ao mundo a democracia, concedo-lhe o livre-arbítrio de caminhar para a própria desgraça estampando em face o sorriso antes oferecido a mim. A felicidade é um mero escambo, hoje eu entendo.

Entendo, agora, que minha companhia me basta, pois sou pleno em mim, e nem mesmo o sofrimento teve forças o bastante para continuar a atormentar-me. Agora me sou todo ideia. Agora me sou todo Sabedoria.

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Os ombros suportam o mundo

Chega um tempo em que não se diz mais: meu Deus.

Tempo de absoluta depuração.

Tempo em que não se diz mais: meu amor.

Porque o amor resultou inútil.

E os olhos não choram.

E as mãos tecem apenas o rude trabalho.

E o coração está seco.

Em vão mulheres batem à porta, não abrirás.

Ficaste sozinho, a luz apagou-se.

Mas na sombra teus olhos resplandecem enormes.

És todo certeza, já não sabes sofrer.

E nada epseras de teus amigos.

Pouco importa venha a velhice, que é a velhice?

Teus ombros suportam o mundo

e ele não pesa mais que a mão de uma criança.

(…)

Carlos Drummond de Andrade

(Sentimento do Mundo. In: Poesia e prosa (organizada pelo autor).

Rio de Janeiro, Nova Aguilar, 1988. Volume único.)

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Eu esperava escrever algo completamente diferente para vocês, mas este texto explodiu dentro de minha cabeça quando eu li Drummond, há algumas semanas.

Abraços e até outubro.

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