Niterói, dia 07 de abril de 2010. Céu nublado, quando fui pro colégio, vi o pessoal da Defesa Civil lá em baixo, engraçado, foi a primeira vez que vi ‘’algo’’ do governo vir aqui na comunidade. Quarta-feira, aula de Sociologia, Segregação racial, o professor falou sobre um tal de Martin Luther King que deu esperança aos negros, falando que ele tinha um sonho de um convivência igualitária, blá, pra que gerar expectativa com algo impossível? Dormi o resto da aula. Bateu o sino, é hora de trabalhar, só uma passada rápida em casa pra esquentar o almoço pra minha irmã mais nova. Ninguém vai mais ao mercado do seu Zé, fico o dia inteiro parada no caixa, quando aparece alguém, ou é da família dele ou é pra devolver mercadoria vencida. Ele está querendo fazer uma promoção este fim de semana, não sei por que, não vai adiantar, o povo vai continuar sem dinheiro até para o mais barato, e ele vai continuar sem clientes. Liguei a televisão, e vi que a Defesa Civil ainda estava lá no morro, nem sei pra que, não tem porque ter esperança de alguém vivo lá, foram soterrados. Fim de mais um tedioso expediente, volta pra casa. Tomei banho, ensinei o dever a Julinha, e percebi que ela estava com dificuldade de leitura, não quis ajudá-la, afinal, daqui uns anos ela iria terminar o ensino médio e trabalhar no outro caixa do mercado do seu Zé, seria dar-lhe expectativas a toa. Fomos dormir antes da novela, não queria ver aqueles bonitões e pensar que um dia poderia achar um igual para mim ou para a Júlia. Deixei-a no seu quarto e fui para o meu. Um barulho estranho, fui para a varanda ver o que era, foi quando vi uma onda de barro engolindo as casas que estavam acima da minha, corri para o quarto de Julia, mas a lama me pegou no meio do caminho, que dor terrível, havia pedaços de pau, pedras, móveis e gente junto ao barro que me arrastou, foi então que o desespero aniquilou a minha dor, onde estava minha irmã, quando o deslizamento chegou ao fim, eu ainda estava consciente, só com o rosto descoberto de terra, e absolutamente ninguém por perto, foi ali que fiquei por duas horas gritando e chorando, chamando pela Julia, com dor e medo, até que um bombeiro me encontrou, me tirou de lá, uma das dores passou, mas a maior delas não. Onde estava minha pequena. A menor das dores me fez desmaiar, quando acordei, estava entrando num hospital, um médico acompanhava minha maca, ele parou no corredor e uma enfermeira lhe disse que tinha acabado de entrar com uma menina de oito anos, e que ainda vestia pijama. Ele me encostou na parede, junto com mais umas quinze macas, me deu um remédio para aliviar a dor, a enfermeira voltou e disse que a garota havia morrido, segurei o médico pela mão, Dr.David estava gravado em seu jaleco, o pedi para que me contasse como era o pijama desta menina. Ele me fitou por um momento e no meio do maior caos da minha vida, ele me disse que tudo iria ficar bem. Dormi. No outro dia e soube que havia perdido minha irmã, minhas coisas, minha casa, meus vizinhos, meus amigos, mas graças aquele médico, eu aprendi a não perder as esperanças.
OBS.: Dedico este texto ao Dr.David, pela idéia inicial do texto e por sempre estar por “perto”.
domingo, 18 de abril de 2010
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5 comentários on "A última que deveria morrer"
aiai Dra.
Marcante,
Simplesmente d+ Dra. ;)
Cara, que texto bom, parece que a gente ta dentro dele :)
O "geek da semana" gostou, hauahauh
Muito bom minha Dr. Laís..
UIHASUIHSAUIASHIUASH..
A maior lição do texto é..
Não despreze lições de "MLK", nem o mercado do Seu Zé.. UIHASIUSAHIUSA
beijos
A.Branco ;)
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