Dia 28 de Março de 2010 às 17:00
Eu não troco um bêbado por um sóbrio, mesmo que um sóbrio esteja bêbado, eu não troco um doido por um sujeito todo bem informado, atualizado e dentro da última modinha, eu não troco um doido, aliás, por nada nesta vida, eu não troco uma puta por uma moça de família cheia de fantasias tão de acordo com a última moda nos salões das velharias, eu não troco a selva africana pela tua estrada cercada de flores amarelas, eu não troco a minha guimba de cigarro pelo teu gel no cabelo, nem a minha última peça de roupa amassada por esse teu sorriso besta, eu não troco a minha falta de vontade pela tua ambição, nem as minhas pernas frágeis pela tua academia, eu não troco o beijo de minha mãe doente pelos beijos dados na tua última balada, em dezenas de menininhas todas tão lascivas e afetadinhas, eu não troco a tua boça de machão pelo meu amor pelas mulheres, e eu não troco a minha ignorância pela tua esperteza e safadeza, nem meus dois únicos amigos pelas tuas duas ou três contas no Orkut, FaceBook, o escambau, lotadas e vazias, eu não troco a minha falta de jeito, pela tua habilidade com futebol, basquetebol, sinuca, poker e jogo do palitinho, tudo aquilo que te faz esquecer que perder é o maior aprendizado que se pode ter e que perder de propósito é ainda mais interessante e alucinante, quando então a gente simplesmente para pra pensar e vê o quanto tudo pode ser tão besta e sem propósito, e eu não troco a minha raiva pela tua educação, polidez, diplomacia, nem a minha busca de sentido pela tua última teoria, eu não troco o futuro que eu não vou ter, pela tua casa própria, por tuas viagens, por teu guarda-roupa com a última coleção, datada, eu quero este instante, na forma como ele é, problemático, caótico, desastrado, sem planejamento nenhum, descuidado, deprimente, consciente, sensível, inesperado e indescritível, e não troco o desastre que foi minha educação por tua MBA na FGV, eu quero o meu idioma fora de toda cartilha, o meu pensamento fora de todo esquema, a minha curiosidade no cimo das árvores, longe dos homens, longe da cidade, e mais próxima do que for, desde que seja qualquer outra coisa. Eu não troco estas mãos por tudo o que apenas elas tocaram, nem estes olhos pelo que não souberam enxergar, nem este coração envelhecido, nem as sobras do meu fígado, nem as sobras do meu prato, nem o meu prato que é de papel, e ainda menos a fome com que a vida me ensinou a arte da negação.
(Autor(a), quem é você?)
Do blog Quase Colorida
(Adaptado por Gabriela Leite)
3 comentários on "A Arte da Negação"
depois eu que me complico...
troca a sua figurinha pela minha, pelomenos?!
Não troco figurinhas...
Mas tenho tazos, caso você se interesse.
P.S São do Tiny Toon ainda, hein ;)
Não troco meus santinhos de políticos pelos seus tazos, inclusive porque eu concordo com a ideia do post.
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